A queima de livros moderna

27/09/2019


Em teoria somos seres evoluídos. Nós temos a tecnologia ao nosso favor, a literatura está cada vez mais em ascensão (mesmo que o consumo de livros possa ser menor, devido a tantas outras opções de entretenimento).; Porém temos tantos outros problemas sociais que as distopias clássicas parecem estar cada vez mais próximas de acontecer e, em alguns casos, até parece já estar acontecendo.

É de conhecimento de qualquer leitor o livro Fahrenheit 451, onde o protagonista é um bombeiro que queima livros. Uma sociedade totalmente alienada pela tecnologia — o livro foi publicado pela primeira vez em 1953 e nesta época as pessoas não faziam ideia de onde a tecnologia chegaria, portanto é bom frisar que para nós ver as cenas onde a esposa do bombeiro conversa com os parentes em algo que parece ser uma televisão é banal, mas para eles era uma grande novidade — e que vê os livros como uma ameaça. Em uma época pós 2ª Guerra Mundial não é muito difícil imaginar o porque do autor ter cogitado esse tema para seu livro, já que é bom relembrar que lá em 1933, na Alemanha Nazista, houve uma grande queima de livros que eram considerados fora dos padrões da ideologia nazista. Grandes autores e pensadores fazem parte da lista, dentre eles Thomas Mann, Freud, Einstein, Marx e Nietzche (não vamos esquecer que essas pessoas ainda são odiadas por algumas ideologias politicas). O pior de tudo é que a opinião pública e até a mídia ignoraram isso. No entanto é difícil dizer com certeza se foi por medo ou concordância. Então qual o motivo de tanta surpresa ao saber que um livro foi censurado e/ou proibido?

Vivemos em uma ilusão de liberdade. Nós passamos acreditar que podemos fazer o que queremos, que podemos ter autonomia com nosso próprio corpo e a liberdade de escolher quem iremos amar ou simplesmente transar. Nós chegamos em um ponto em que estamos alienados ao refletir sobre todas as consequências que a vigilância das mídias sociais nos dá (e ai já vamos entrar em 1984, que não é o assunto deste post). Nós simplesmente ignoramos o fato de que não temos controle de nada em nossas vidas. Muito menos dos livros que lemos.

Um bom exemplo disso foi o que houve na Bienal Internacional do livro que, este ano, aconteceu no Rio de Janeiro. Não vou estender a noticia, mas todos sabem que diz respeito do Crivella criticando um livro que contém um beijo gay e querendo, assim, censura-lo como conteúdo pornográfico. O tiro saiu pela culatra, pois além do livro esgotar em 40 minutos certo ytuber distribuiu cerca de 10k livros lgbtq+ no evento.

O que poucas pessoas perceberam é que não se trata apenas de uma censura a um livro lgbtq+ e sim a toda arte que temos disponível nos dias atuais. O que começou com um livro vai a todos os conteúdos que gostamos de ver na internet, visitar em uma galeria, conversar com os amigos. A ditadura, às vezes, não é colocada nas nossas vidas do dia para a noite e sim devagar. A queima de um livro não precisa ser literal em uma praça publica, mas sim sua retaliação na internet ou o boca a boca dentro de uma igreja. O que o tal prefeito fez foi sim uma queimação de livro, assim como tal governador do estado de SP fez na mesma semana com livros didáticos.

Como seres humanos, e passiveis de erros, temos uma grande responsabilidade de nos "vigiar" e como leitores devemos nos impor — assim como feito no caso da Bienal, mas fazem em todos os casos de censura — para que seja evidente que não somos idiotas, e que acima de tudo todo esse conhecimento que os livros nos trouxe é uma recompensa maravilhosa. Além do mais há a responsabilidade social de nos reconhecer como seres imperfeitos e em constante aprendizado. Mais do nunca é hora de se juntar.

OBS História:
Também houve uma queima de livros brasileira. Em 1937 Getúlio Vargas censurou algumas coisas por se tratar, segundo ele, de apologia ao comunismo.

4 comentários

  1. Quando eu li esse livro, eu não sabia o que fazer, de verdade mesmo.
    Eu lembrei na hora da queima de livros de 37, me deu uma dor no coração. E realmente eu fico muito assustada quando vejo que as distopias e ficções estão mais perto da realidade do que a gente pensa. Quando eu li A Revolução dos Bichos, eu fiquei arrepiada de tanta coisa atual que tem ali, e o negocio foi escrito na época de Stalin.
    Amei seu texto, muito lindo!

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  2. Olá, tudo bem? Ainda não li esse livro, mas tenho bastante curiosidade. Adorei tua reflexão, realmente o que temos é apenas uma ilusão de liberdade, o que é assustador. Isso que aconteceu na Bienal do Rio foi absurdamente chocante, não tenho nem palavras para descrever.

    Beijos,
    Duas Livreiras

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  3. Eu ainda não li esse livro, mas ele trata assuntos tão importantes e deve trazer inúmeras reflexões. Sua resenha realmente me deixou curiosíssima e infelizmente é como você disse: "não temos controle de nossas vidas". Com certeza quero ler essa obra.

    Beijos,
    Blog PS Amo Leitura

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  4. ótimo texto! Como você disse, temos que nos manter vigilantes porque ao contrario do que muita gente pensa, uma ditadura não começa de repente da noite pro dia e sim aos poucos. Hoje é uma HQ que segundo eles é um perigo para as crianças, amanhã é nosso direto de pensar, de falar e fazer o que quiser. É por isso que livros assim são tão importantes ainda nos dias de hoje.
    Beijos!

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